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Turismo pet friendly x proteção animal: conexões e diferenças que importam

Foto: Cris Nadalin
Foto: Cris Nadalin

Hoje quero compartilhar uma reflexão importante sobre dois temas que, embora muitas vezes caminhem juntos, não são a mesma coisa: o turismo pet friendly e a proteção animal. Eles se conectam, sim — e profundamente. Mas, quando confundimos seus papéis, perdemos a clareza sobre onde cada causa começa e até onde deve ir.



A desigualdade também tem reflexos no bem-estar animal

Vivemos em um país marcado pela desigualdade. Mesmo com um dos maiores mercados pet do mundo, ainda convivemos com índices alarmantes de abandono. Dados da Organização Mundial da Saúde estimam que existam cerca de 30 milhões de animais abandonados no Brasil — 20 milhões de cães e 10 milhões de gatos — e mais de 100 mil cães vivendo em abrigos à espera de uma família.


Agora você deve estar se perguntando: “Mas o que isso tem a ver com turismo?”. A resposta é simples: tudo.



A proteção animal reflete no turismo — e o turismo pode refletir de volta

Um ambiente seguro, limpo e livre de situações que causam tristeza é essencial para uma viagem agradável. Animais em situação de rua impactam o turismo porque representam riscos à segurança e à saúde pública, além de afetarem a fauna local e o meio ambiente. Também geram desconforto na população e nos turistas, que se sensibilizam ao ver o sofrimento desses animais.


Um destino com altos índices de abandono, maus-tratos ou sem políticas públicas de bem-estar animal dificilmente pode ser considerado verdadeiramente pet friendly. O turista que viaja com seu pet costuma ter um olhar mais sensível — ele percebe o sofrimento animal, e isso interfere diretamente na sua percepção sobre o destino.


Eu me entristeço sempre que vejo animais nas ruas, e isso inevitavelmente afeta minha experiência de viagem. Já ouvi relatos semelhantes de outros viajantes diversas vezes.



Ser pet friendly de verdade é ser inclusivo

O termo “pet friendly” está em alta. Ele significa “amigo dos animais” e é usado para identificar estabelecimentos que aceitam pets. No entanto, para ser pet friendly de verdade, é preciso ser amigo não apenas dos pets turistas, mas também — e principalmente — dos pets locais.


Há ainda um tema delicado: muitos estabelecimentos aceitam apenas cães de pequeno porte. Parece um detalhe, mas traz consequências sérias. A maioria dos cães à espera de adoção é de porte médio ou grande — justamente os menos aceitos em hotéis, cafés e passeios. Ao restringir o turismo apenas a cães pequenos, limita-se a participação de uma minoria de raças, reproduzindo desigualdades e desestimulando a adoção.


Além disso, doenças endêmicas como leishmaniose, dirofilariose e raiva também influenciam na escolha de destinos. Locais com altos índices de zoonoses acabam afastando visitantes — com ou sem pets.



Quem são os protagonistas da proteção animal

A proteção animal é uma causa estruturante que antecede qualquer iniciativa de turismo. É uma pauta de base, que envolve diversos atores: ONGs, protetores independentes, veterinários, profissionais da saúde animal e humana (na perspectiva da saúde única), universidades, centros de pesquisa e o próprio Estado, por meio de secretarias de saúde, meio ambiente e bem-estar animal.


Também fazem parte dessa rede os legisladores, delegados e juízes que elaboram e aplicam leis, além da sociedade civil, que tem papel essencial na tutela responsável e na cobrança por políticas públicas consistentes.


Esses são os protagonistas da proteção animal — aqueles que lidam diariamente com o abandono, o controle populacional, as zoonoses e a convivência ética entre humanos e animais. É um campo que exige conhecimento técnico, políticas públicas e ação comunitária muito antes de se conectar ao turismo.



O turismo pet friendly tem outros atores e competências

O turismo pet friendly pertence a outro campo, com diferentes protagonistas e responsabilidades. Envolve profissionais do turismo, hotelaria, eventos, gastronomia, transporte e destinos que se estruturam para acolher viajantes acompanhados de seus pets. O foco está na experiência, no conforto, na segurança e na hospitalidade.


É importante ressaltar: realizar campanhas de arrecadação de ração ou eventos de adoção são ações que apoiam a causa animal — e o turismo pode (e deve) apoiá-las —, mas isso não significa fazer turismo pet friendly. São causas que dialogam, mas cada uma tem seus próprios objetivos, desafios e papéis.



Conexões e compromissos éticos

Turismo e proteção animal se conectam porque ambos influenciam a forma como nos relacionamos com os animais, com os espaços e com a sociedade. O turismo pode e deve ser um aliado da causa animal, desde que reconheça seu papel: o de apoiar, fortalecer e dar visibilidade aos verdadeiros protagonistas dessa pauta.


Ao mesmo tempo, a causa animal ganha força quando o turismo incorpora princípios de respeito, responsabilidade e inclusão.



Em resumo

Proteção animal é base — política pública, saúde única, bem-estar, legislação, ciência e responsabilidade social.


Turismo pet friendly é consequência — e também oportunidade: acolhimento, experiência, cultura e mercado.


São causas diferentes, mas que se encontram em um ponto essencial: o compromisso ético com a vida.


Porque, no fim das contas, o turismo pet friendly só é verdadeiro quando começa pelo respeito. E o respeito, nesse caso, inclui todos — humanos e não humanos, turistas e moradores, de todas as espécies.

 
 
 

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